8 de fevereiro de 2009

Próxima estação: Tempo

Próxima estação: Marquês de Pombal. Fala incansável, a voz de todos os dias, de todas as horas naquela toupeira irrequieta que percorre túneis escuros e pesca pessoas para logo as deixar.
Saem pessoas, entram pessoas.

Ao fundo, na última carruagem, vestindo umas iguais a tantas calças de ganga, e um igual a tantos blusões azuis, está um rapaz. Os phones nos ouvidos adivinham-lhe a juventude que a cara não esconde e que o gel no cabelo negro acentua. Encostado ao saco adidas que o ombro direito suporta, olha o relógio demoradamente como quem o interroga numa conversa mental que só os dois entendem.

Olho-o curiosa, quando todos os outros, na sua azáfama interior, o parecem ignorar.

Próxima estação: Parque. Saem pessoas, entram pessoas.

O saco, ainda que pequeno, pesa-lhe. Pousa-o no chão. Não, não é no chão que fica. Pega-o de novo. Passa-o para o ombro esquerdo. Não, também não é assim que fica. Dá uns passos em frente e senta-se. Agora sim pode pousar o saco entre as pernas, cruzar os braços e desfrutar da música e da viagem.

Próxima estação: S.Sebatião. Saem pessoas, entram pessoas.

Descruza os braços, tira o telemóvel do casaco azul e olha-o por segundos para logo o colocar no mesmo bolso de onde saiu momentos antes. Cruza os braços. Segundos depois volta a descruzar. Olha o relógio com grande impaciência.

Apoia-se sobre as pernas entortando o corpo como se quisesse segredar ao ouvido da velhota que à sua frente lê com prazer uma qualquer página de um gratuito. Volta a olhar o relógio recostando-se sobre a cadeira e deixa que os olhos se passeiem pelos restantes companheiros de momento para logo os pousar nas horas que o relógio marca.

Quererá parar o tempo ou ajudá-lo a avançar?

Continua a olhá-lo e a (re)olhá-lo.

Próxima estação: Praça de Espanha. Saem pessoas, entram pessoas, mas ele continua ali na sua santa impaciência. Uma impaciência igual a tantas que se sentam naqueles bancos todos os dias. Iguais a tantas outras que correm nas escadas antes do bip final. Igual a tantas outras que não se fazem rogadas por ignorar o mundo e apenas sentirem o tic-tac e o efeito dele. Um tic-tac que controla sem se deixar controlar. Um tic-tac difícil de esquecer.

Próxima estação: Jardim Zoológico. Pega no saco e sai. Saio também, deixando a pena de não ver onde o relógio o leva. Comboio ou autocarro. Pais ou Namorada. Trabalho ou lazer. Corre. Corre sem largar o saco.

Corre contra um tempo que não parou para o ver correr. Corre porque já é difícil andar. E muitos sem sequer olharem ao relógio, correm com ele.

Correm porque o tempo, é como todos aqueles que lutam e correm contra ele…Corre. Corre sem deixar tempo para um andar que mesmo acelerado seria estranhamente perder tempo.


[Crónica apresentada em Géneros Jornalísticos ]

Sem comentários: